terça-feira, 29 de setembro de 2009

Corpo ingênuo.

Era escultural como nenhum outro, Ingênua tinha um corpo perfeito e invejado pelas mulheres mais maduras.

Seios novos e pequenos, cintura fina como se usasse corpete, cabelos compridos e volumosos, rosto delicado e puro.

Escondia seu corpo por entre os panos de cores mórbidas. Não queria que ninguém a enxergasse pelo seu corpo, que era de chamar muita atenção. Suas saias eram tão compridas que ao caminhar nas ruas de terra, entupia a barra de barro, tendo assim, que lavar todos os dias, causando calos e mais calos em suas mãos brancas e nuas.

Era solitária, não possuía sorriso nem lágrimas, era uma mulher sem expressão.

Queria apenas alguém que a fizesse enxergar quem ela realmente era. Encostava-se no bar e sonhava com um dia que poderia casar e ter filhos, filhos de um dos homens que ali estavam, talvez.

Peregrinava depois de horas parada, observando e sonhando. Não tinha rumo nem vontade própria de viver, só não tirava a vida por ser medrosa, tinha medo de não morrer e sofrer com as conseqüências.

Após a morte de seu cachorro, único companheiro e ouvinte, Ingênua decidiu arriscar-se na vida. Largou tudo, a mãe doente, o pai pedreiro e o irmão manco para poder ter uma vida que ela chamava de ‘decente’.

Foi apontada na rua, castigada por todos espiritualmente. Mas nada mais importava a não ser a liberdade que ela mesma fornecia em sua vida.

Correu sem rumo e acabou por cair em uma vila, esfolou o rosto, os seios e a barriga. Quase não era mais a mesma. O corpo era o que tinha de mais precioso, e esse ficou espalhado pela estradinha de terra da pobre vila.

Chorou as amarguras e internou-se em um hospício, internou-se por conta própria. Descobriu-se, por completo. Não era igual as outras meninas, o seu único parceiro e companheiro foi o cachorro.

Aprendeu a enxergar-se internada, onde cativou um cego que a desejava sorrindo com os lábios.

(23/02/2007)

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